Estratégia de evento: Casa do Povo cresce 2,5x a arrecadação

estratégia de eventos

Para uma captação de recursos eficiente, a atração e aquisição de doadores é apenas o primeiro passo.

  • Depois de conseguir um novo doador, como você o engaja?
  • Quais estratégias usa para incentivar a recorrência da sua contribuição?

Com um plano sólido de engajamento, como uma estratégia de evento, os doadores fiéis podem ampliar muito a arrecadação da sua ONG, além de garantir mais previsibilidade financeira.

Conteúdo

Neste texto, vamos apresentar um estudo de caso para te ajudar a pensar sobre as possibilidades de captação para a sua organização.

Vamos falar, principalmente, sobre evento anual da Casa do Povo. Essa instituição promove atividades culturais, abriga coletivos, associações e grupos artísticos atuando entre o campo cultural e social.

Em primeiro lugar, uma das fontes de recurso da Casa do Povo é o evento anual de arrecadação – uma atividade beneficente voltada para a manutenção do espaço e sua programação.

Este evento se reinventa a cada edição e engaja um público de alto poder aquisitivo que não necessariamente frequenta o dia a dia da instituição. A edição em 2021 teve mais que o dobro da arrecadação da edição do ano anterior. Isso devido à estratégia de evento utilizada!

A Casa do Povo

A Casa do Povo é uma organização de São Paulo – SP que atua no campo expandido da cultura, utilizando a arte como ferramenta crítica para um processo de transformação social. 

O espaço é habitado por uma dezena de grupos, movimentos e coletivos que realizam diversos projetos. Por sua vez, as atividades acontecem nos eixos de trabalho da organização: memória, práticas coletivas e engajadas, diálogo e envolvimento com o seu entorno. 

Nessa empreitada, o público é compreendido como um ator de sua transformação. Além de visitar a ONG, ele também propõe atividades, fazendo do espaço um local de encontros, formações e engajamento.

Estratégia de evento: jantar anual de arrecadação

A Casa do Povo promove desde 2016 um evento anual de arrecadação com apoiadores, sendo uma celebração e uma oportunidade de conexão da organização com os doadores e a comunidade. Artistas, empresários, profissionais liberais e lideranças comunitárias e do terceiro setor comparecem ao evento todos os anos.

A receita vinda das doações recorrentes representa cerca de 20% do orçamento anual da Casa do Povo.

A cada ano, a organização tem uma proposta diferente para o evento anual, mas o objetivo é sempre unir essa rede de apoiadores e oferecer uma experiência coletiva e memorável, fidelizando os doadores e criando um importante caixa desvinculado, ou seja, uma verba livre das limitações de execução presentes nos editais e nas leis de incentivo. 

Até o ano de 2019, os apoiadores eram convidados à sede da Casa do Povo para um evento presencial – um jantar, uma apresentação musical ou uma performance. Participaram do evento chefs de cozinha e artistas de forma voluntária, bem como os doadores. As contribuições se davam por meio da compra de um ingresso.

No entanto, com a pandemia e a necessidade de isolamento social, foi necessário encontrar uma estratégia de evento alternativa para realização do evento anual. Em 2020, o jantar foi enviado para a casa dos apoiadores.

Em 2021, os apoiadores ofereceram o jantar para as famílias do bairro do Bom Retiro, onde a Casa do Povo está localizada. Esta ação só foi possível porque, durante os dois primeiros anos de pandemia, a Casa do Povo estabeleceu com a população vulnerável do seu entorno uma relação próxima e contínua ao que chamaram de articulação comunitária.

Invertendo os papéis: apoiadores com participação ativa

Desta forma, a organização resolveu inverter os papéis: os próprios apoiadores ofereceram o jantar para famílias do bairro do Bom Retiro em situação de vulnerabilidade social.

Em troca, o bairro ofereceu aos apoiadores uma obra de arte feita pela cooperativa de costureiras Emprendedoras Sin Fronteras – formada em sua maioria por mulheres imigrantes moradoras do Bom Retiro – em parceria com o fotógrafo Mauro Restiffe. Desta forma, o ciclo virtuoso se completou!

Simultanemante, os jantares foram entregues em pensões, cortiços e vilas do bairro pelas mãos de voluntários da Casa do Povo que já conheciam a vizinhança. Ao fim do evento, a organização conseguiu arrecadar 258% a mais do que arrecadou no evento do ano anterior. 

Veja, agora, os três pilares da estratégia de evento que fez dessa campanha um grande sucesso: 

1. Escuta ativa e empoderamento: outra perspectiva para o trabalho social

Primeiramente, um dos grandes diferenciais da estratégia de evento da edição de 2021 foi a integração entre todos os setores envolvidos na produção, planejamento e realização do Jantar com a comunidade local.

Durante a pandemia, a Casa do Povo desenvolveu uma relação mais profunda com as famílias das comunidades assistidas. Bairros com históricos sociais complexos que têm pouca estrutura foram auxiliados e convidados a realizar trabalhos e atividades no espaço da organização.

Com isso, a organização passou a realizar um trabalho de escuta ativa e integração comunitária.

Entendendo a realidade das pessoas, foi possível prestar um serviço que não se limita ao assistencialismo, mas sim ao reconhecimento das necessidades reais e empoderamento delas. Assim, as famílias ganharam condições de trabalhar e protagonizar sua atividade social.

Com esse trabalho, a organização passou a abrigar e incubar coletivos que nasceram espontaneamente. Um deles é o Emprendedoras Sin Fronteras, o coletivo de costureiras, em sua maioria imigrantes, que, pela primeira vez, criou um grupo de trabalho autônomo e autogerido, sem intermediários. Até então, elas trabalhavam em situações muito precárias nas fábricas da vizinhança. 

A partir dessa conexão, a Casa do Povo aprofundou sua atuação social e conectou-se com as comunidades locais. Este dado sensibilizou os apoiadores do evento anual e  se tornou parte fundamental da comunicação que fez do evento um sucesso, pois além de receberem o jantar em suas casas, as famílias também participaram ativamente na confecção das contrapartidas.

Desta forma, a doação para o evento ganhou ainda mais significado para os doadores, ampliando o engajamento. Em suma, vários dos apoiadores participaram da ação de entrega dos jantares indo de porta em porta e conhecendo estas famílias pessoalmente.

2. Um apoiador, múltiplas campanhas

Bem como, o segundo pilar de sucesso é trabalhar a comunicação com seus diferentes públicos para além do período de vigência da campanha. Trabalhar a difusão das ações, atividades e cotidiano da instituição com o público – apoiador direto ou não – facilita muito na hora em que estamos com uma campanha específica no ar. 

Frequentemente, um mesmo apoiador participa de mais de uma campanha da instituição, sejam elas recorrentes ou avulsas. Assim também, isso demonstra que muitas pessoas entendem as diversas camadas de atuação da instituição e encontram, dentro das possibilidades de apoio, sempre uma forma de atuar que caiba no seu bolso e atenda suas expectativas de benefícios.

No caso do evento anual, houve pessoas que doaram o valor máximo de R$ 9 mil que tinha como retorno a série completa de 5 fotos de Mauro Restiffe e Emprendedoras Sin Fronteras. Mas também houve pessoas que poderiam doar um valor à sua escolha a partir de R$ 200 e também receberam um presente especial.

Quem não pode investir dinheiro, se voluntariou para entregar as refeições nas casas das famílias do Bom Retiro. Desta forma, o público deixa de estar distante e participa ativamente da ação. 

Outra estratégia de evento que contribui para o sucesso é a frequência. As pessoas esperam o evento anual e ficam curiosas para saber: O que será que vem desta vez?. Esta fidelidade cria uma comunidade que se vê, naquele período, compartilhando da mesma experiência. 

A combinação destas diferentes campanhas (recorrentes e pontuais, de valores altos e baixos) deixam as pessoas confortáveis para tornarem-se parte da nossa rede e são tratadas todas com a mesma atenção. E isso também faz parte da estratégia de evento.

Para além dos benefícios específicos de cada campanha, todo mundo recebe, por exemplo, a publicação da Casa do Povo Nossa Voz uma vez por ano em casa, não importando como ou com quanto a pessoa contribui.

Mais benefícios

Dessa forma, além de garantir sua receita mensal, os apoiadores ajudam a Casa do Povo a garantir um aumento sazonal na sua arrecadação. Essas doações são destinadas a projetos e iniciativas para o ano seguinte, além de reformas na infraestrutura do espaço da organização.

Por exemplo, o Teatro de Arte Israelita Brasileiro (TAIB), no Bom Retiro, é localizado na Casa do Povo e foi um dos palcos mais frequentados da cidade de São Paulo.

No entanto, a estrutura deteriorou-se com o tempo e precisa de reformas. O apreço pelo patrimônio cultural e histórico que é o TAIB levou a Casa do Povo a iniciar um projeto de restauração, apoiado pelos associados.

Confira o depoimento da atriz Fernanda Montenegro sobre o teatro:

3. A captação é parte do conteúdo

O último fundamento da estratégia é a integração entre doadores, comunidades e influenciadores. Relacionar os públicos envolvidos na campanha é a cereja do bolo da campanha anual da Casa do Povo em 2021. A Mônica Novaes Esmanhotto, coordenadora de desenvolvimento institucional da Casa do Povo, destacou ao conversar conosco:

“Uma bandeira que eu carrego aqui na Casa do Povo é que não vemos a captação de recursos separada da produção de conteúdo. Todos os recursos adquiridos com ações de engajamento e de divulgação têm um conteúdo por trás. A campanha só foi um sucesso porque nossa comunicação abrange todas as etapas, todos os envolvidos. A captação também gera conhecimento, interação e cria laços de afeto.”

 

Para ter um sucesso real nas suas campanhas, a Casa do Povo une todo seu público e incentiva a sua integração e costura uma narrativa que para em pé! Não é só um pedido de dinheiro.

Por sua vez, no caso dado evento anual de 2021, existiam muitas pessoas impactadas. Os agricultores orgânicos de Parelheiros, as costureiras da cooperativa, todos os parceiros que doaram ingredientes e insumos e até os mais de 30 funcionários da cozinha industrial onde a chef Paola Carosella cozinhou as mil refeições. 

Todos estavam envolvidos na iniciativa e isso é um fator decisivo para o engajamento dos doadores, afinal, tudo começa com a doação.

E na sua organização? Os beneficiados e os doadores possuem algum tipo de relacionamento? Como as pessoas que ajudam na arrecadação e realização dos projetos se engajam com seu propósito?

Mão na massa: execução da campanha e resultados

Na data do evento anual, no fim de 2021, a chef Paola Carosella preparou refeições para servir 250 famílias da vizinhança, o que representa cerca de mil pessoas entre crianças, adultos e idosos cadastrados nas ações da Casa do Povo pela frente de articulação comunitária. 

As refeições foram preparadas com alimentos orgânicos e produzidos por famílias agricultoras da região do extremo-sul de São Paulo. Da mesma forma, os jantares foram entregues em pensões, cortiços e vilas do bairro pelas mãos de voluntários e doadores da Casa do Povo que conhecem muito bem a vizinhança.

Todos que doaram receberam uma edição limitada de uma obra inédita do fotógrafo Mauro Restiffe em colaboração com a Cooperativa Emprendedoras Sin Fronteras (CESF), um dos coletivos da Casa do Povo.

Ainda mais, cada fotografia foi impressa em tecido e bordada manualmente pelas cooperadas da CESF. Cinco imagens foram produzidas, com tiragem limitada de 50 cada uma. 

O evento anual em 2021 foi um grande sucesso. Com a ajuda de voluntários, patrocinadores e doadores, uma estratégia sólida e integrada entre todos os públicos, a Casa do Povo conseguiu aumentar sua arrecadação anual em 215%, em comparação ao ano anterior.


Conclusão

Assim, muitas vezes, temos dúvidas de como engajar o público de doadores para causas que não são urgentes ou imediatas. No entanto, a cultura é parte fundamental de qualquer sociedade, e o trabalho de incentivo e apoio é essencial. 

Neste estudo de caso, a Casa do Povo nos mostra que é possível ajudar, engajar e empoderar as pessoas que vivem nos seus arredores e precisam de apoio.

A instituição não estava pedindo dinheiro para si. Mas demonstrando que um gesto move muitas pessoas e impacta positivamente em cascata!

Sendo assim, com uma rede de apoiadores engajada e uma estratégia de comunicação integrada com a captação, é possível mobilizar muito mais recursos, aproximando os apoiadores e os conectando com a realidade local, além de oferecer uma experiência cultural e artística incrível.

Por fim, com esse esforço, a organização atingiu um resultado impressionante na sua arrecadação em 2021. E você, o que achou dessa campanha? Qual aprendizado você irá levar para sua organização? Comente aqui embaixo!